Skip to content

veneznot

veneznot2

veneznot3

UM DIA DE FÉRIAS

Aquele fim de tarde estava magnífico… Josias Germano e Marília Olávia estavam em um bar escondido a beira do Grand Canale de Veneza… a funcionária do apartamento que eles alugaram deu a dica: um local totalmente escondido e de difícil acesso, só frequentado por locais… alguns ficavam lá dentro… outros, como os nossos protagonistas, pegavam suas bebidas, saiam e ficavam naquele pedaço da Calle Remer que desemboca no canal, apreciando o crepúsculo envolvendo o Grand Canale…

Ele reparou que aquele crepúsculo finalizava um dia magnífico: após o café da manhã foram a uma pequena loja de vinhos perto do Canale Cannaregio e enquanto o dono enchia uma garrafa com um vinho local vindo de barricas, eles conversaram com os senhores locais que iam lá para bater papo… um velhinho de boina e cachecol contava histórias da batalha de Monte Casino… enquanto uma velhinha arrumada de cabelo channel protestava contra os políticos corruptos…

Ela reparou que estes bate-papos fortuitos são a alma das viagens e que estava feliz por terem se hospedado naquele bairro, onde ainda existe uma vida local com pequenos comércios frequentados por moradores, ao contrário das imediações da Praça de São Marcos onde não existem ambientes cotidianos… somente ruas com lojas e calçadas entupidas de turistas…

Ele reparou que estava contente pois estava conheçendo lugares diferentes de Veneza, que não havia conhecido em sua passagem anterior pela cidade ocorrida há 17 anos atrás… Agora ele conhecera aquela parte da cidade voltada para a ilha de San Michelle onde está enterrado Erza Pound… Visitara a Igreja da Madonna dell’ Orto e ficara impressionado com os afrescos de Tintoretto: um representando Moisés recebendo as tábuas da Lei, outro com o Juízo Final..

Ela reparou no almoço: haviam comido um peixe grelhado divino denominado orata (pargo) com sal e limão siciliano acompanhado de um vinho branco do vêneto típico: uvas pinot grigio e verduzzo … quando ela foi ao toalete, reparou em uma travessa de tiramisu caseiro… só a sobremesa já valera a refeição senão o dia…

Ele reparou que o que valera dia, além do tiramissu, foi o quadro “Banquete na Casa de Levi” de Paolo Veronese que haviam visto no Museu da Academia… a monumentalidade da pintura o impressionou… já havia estado neste museu mas não se recoradara que era tão bom… os outros quadros que haviam visto lá também eram geniais: Tintorreto mostrando personagens flutuantes, Bellini e Carpaccio mostrando a arquitetura e os personagens de Veneza nos século XIII.

Enquando acabava de beber o seu negroni, Josias Germano disse: “Aliás é interessante como os venezianos homenagearam seus pintores: um virou nome de coquetel, outro de prato de entrada, dizem até que a homenagem a Carpaccio deve-se ao fato que em seus quadros vê-se aquele tom de vermelho característico das fatias de carne crua… faltam as homenagens para Veronese e Tintoretto.. sugiro um prato chamado Veronese e uma sobremesa chamada Tintoretto.. fica mais sonoro… imagine “Por favor dois veronese, um al´ dente outro normal” ou “ Por favor dois tintorettos e dois cafés”

Ela finalizou seu Aperol-Spritz e ambos rumaram para o aconchego do transitório lar… no caminho Josias Germano lembrou-se de um episódio do antigo seriado “Além da Imaginação” (The Twilight Zone*) no qual uma loira vai a uma loja de departamento para trocar um dedal de ouro e após alguns incidentes fica escondida na loja após o fechamento… ao caminhar nos corredores ouve os manequins exclamarem repreensões… os manequins tornam-se humanos e cercam a loira … ela então se recorda que é um manequim também e que durante um mês ao ano tinha permissão para se transformar em ser humano, porém estava atrasada no retorno… deveria ter voltado na véspera, mas se esquecera… os outros manequins conversam e uma morena apanha o elavador se despedindo dos demais… no dia seguinte a loja de departamento abre e enquanto acompanhamos o trajeto de um vendedor, reparamos que a loira havia se transformado em um manequim…

-”Esta estória é uma metáfora das férias”- exclamou Josias Germano -“durante um mês ao ano, podemos deixar de ser bonecos para nos transformar em pessoas…

Pois é – respondeu Marcília Olávia – então vamos viver com intensidade estes dias, pois logo mais nos transformaremos em bonecos…

E caminharam em direção ao Canale Cannaregio respirando a noite de Veneza…

(*) Episódio denominado “The After Hours” disponível na internet (em inglês)

Post a Comment

Your email is never published nor shared. Required fields are marked *