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EM UM BOTECO DE AÇORES

Josías Germano estava feliz… finalmente ele estava no Peter Café Sport na cidade de Horta, Ilha do Faial, Açores… sempre lera sobre aquele local… seja em Antonio Tabucchi, Enrique Vila-Matas ou Agustin Fernandez Mallo… aquele bar também fora eleito como um dos melhores do mundo pela revista Newsweek…

Ele achou que o bar lembrava vagamente um pequeno restaurante que estiveram anos atrás, em outra ilha… a ilha em questão se chamava Chiloé e ficava no Chile… lá havia uma cidade portuária chamada Ancud, na qual havia um pequeno restaurante chamado Kurantum (*), e realmente tinha elementos em comum com o Peter Café Sport: forração em madeira, bandeiras de vários países, decoração peculiar … inclusive havia uma placa genial com o seguinte dizer: “AQUI SE COME MAL PERO AL FRENTE SE COME PEOR”… lá realmente eles haviam comido mal.. o prato com o nome da casa era a atração principal… o Kurantum é muito famoso na patagônia chilena e argentina… um cozido com mariscos, frango, carne de porco, batata e um caldo bem temperado, feitos com uma folha também chamada Kurantum…

Ela concordou quanto a semelhança dos locais, mas disse que tinha arrepios e tremedeiras só de lembrar do gosto daquele prato…

Ele ponderou afirmando que a comida realmente não era boa… porém lembrou-se da plaquinha… – Se fôssemos comer no restaurante vizinho seria pior…

Mas agora estavam em outra ilha.. e não estavam guiando como em Chiloé, então podiam pedir bebidas… e deixar a tarde se esvair numa fluidez iluminadora…

– Vou iniciar os trabalhos com uma dose de genebra, tal qual os personagens de Enrique Vila-Matas no “Mal de Montano”… depois vou beber gin-tônico… é gozado que em Portugal, Algareve e Açores eles não falam “gin-tônica” mas “gin-tônico”….

– Eu vou de vinho verde respondeu Marília Olávia…. Ela inicialmente não aprovara a viagem aos Açores… preferia ir para a Grécia… mas agora vislumbrando as belezas daquelas ilhas, dera o braços a torcer e admitira que aqueles cenários deslumbrantes compensaram a viagem…

Após alguas doses a conversa descambou para um único assunto: o paralelo entre as pessoas que vivem em uma ilha de verdade e as pessoas que vivem em ilhas culturais….

– As ilhas reais são cercadas de um belo pedaço de oceano… já as ilhas culturais são cercadas por mares de ignorância…” afirmou Josias Germano

– “É, você tem razão… é por isso que rumamos para o caos…. para um tsunami de ignorância…. ondas de intolerância religiosa, de violência gratuita, de boçalidade tecnologizada… em meio a tudo isso um punhado de escritores, artistas e pensadores em seus mundinhos a refletir sobre os abismos que os cercam….

– E neste bar convergem os dois tipos de ilhéus, ou seja tanto os habitantes desta ilha chamada Faial, quanto os habitantes das ilhas culturais como um Antonio Tabucchi um Enrique Vila-Matas ou um Agustin Fernandez Mallo…

– E o resto dos frequentadores?

– O resto são turistas ou velejadores… Quanto aos velejadores, podemos fazer um paralelo com o apreciadores das artes, ora estão na ilha de um estilo pictórico ora na ilha de uma tendência literária… atravessam os mares da burrice, buscando repouso ora em um bom livro, ora em uma bela exposição…

– E os turistas?

– Os turistas são como ratos ou baratas… surgem de repente infestando o ambiente…

– Mas nós somos turistas… ou você acha que está no pequeno grupo dos grandes escritores?

– Não, apesar de publicar uma coisinha ou outra na internet, eu não me julgo um escritor… ainda mais do grupo de gênios como os que passaram por este local…. eu sou simplesmente um turista… mas sabe… há um jeito de se passar por turista…

– É mesmo? E qual é este jeito?

– É só não viajar… E ficar ilhado em sua cidade…

(*) Para ver sobre o restaurante Kurantum acesse:

http://www.zegeraldo.lugaralgum.com/?m=201204

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