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PASSEANDO EM LISBOA

Josias Germano e Marília Olávia acordaram no terceiro dia de sua estada em Lisboa, preferiram não tomar o café da manhã no hotel e caminharam para um restaurante-boteco na esquina da R. Alexandre Herculano com a R. Mouzinho da Silveira. Lá cada um tomou o seu café acompanhado por deliciosos pastéis de nata… o nosso protagonista salientou para a sua companheira que em Pindorama estes confeitos são chamados de “pastéis de Belém” enquanto que em terras lusitanas pastéis de Belém só podem ser consumidos no bairro de Belém, de modo que todo o resto dos “pastéis de Belém” em Portugal é denominado pastel de nata… Josias Germano continuou a conversa afirmando que o Presidente de Portugal leva uma tremenda vantagem sobre o Presidente do Brasil, pois a sua morada (o Palácio de Belém) está a duas (ou três) quadras da famosa doceria onde os referidos pastéis são produzidos, enquanto que em redor do Palácio da Alvorada só há asfalto, grama, espelhos d’água & emas….

Após o café da manhã a dupla protagonista rumou para o Castelo de São Jorge, reconstrução fake feita por Salazar em uma antiga fortificação… no caminho ruas que lembravam as clássicas ruas mal frequentadas das capitais carioca e baiana…

Josias seguia incomodado com a sua condição de turista, mesmo lembrando da frase “A melhor maneira de não dar uma de turista é não viajar” ou seja que não tinha mais jeito, que deveria bancar o turista e apreciar as terras alheias… depois lembrou-se que com a sobremodernidade o deslocamento espacial mais eficiente (mais pessoas viajando de avião, trens bala, etc.) somado ao crescimento da população mundial, o fluxo de turistas aumentou em todo o planeta: aeroportos caóticos, filas imensas para entrar nos edifícios históricos e a descaracterização do sítio histórico, que de um lugar (com uma função histórica) passara a ser um não-lugar (sem vínculos culturais), uma vez que a afluência contínua de pessoas oriundas de outros locais em visitas superficiais transformava o uso do solo no referido espaço, que antes funcionava como palácio ou fortaleza e agora passava a figurar com centro de visitação, um local de entretenimento… ele então explicou para a sua fiel escudeira que o castelo de São Jorge era uma exceção a regra, pois não havia se tornado um não-lugar em virtude do turismo (como em vários lugares famosos), mas que pelo caminho contrário, tornou-se primeiro um um não-lugar para depois atrair o turismo, uma vez que primeiro veio a reconstrução em estilo medieval (feita por Salazar na década de quarenta) para depois vir a turistada… o prédio originalmente era um alcácer (vila fortificada) na época em que Lisboa era muçulmana (a cidade então chamava-se Al-Ushbuna) e que depois da reconquista cristã em meados do século XII transformou em um castelo em homenagem a São Jorge, castelo este que foi seriamente avariado pelos terremotos ocorridos nos séculos XVI e XVII, caindo em decadência até a referida reconstrução.

Foram almoçar no Nova Ipanema na Av. Libertador, ambos pediram espeto de camarões e lulas, para beber ele pediu uma bagaçeira e uma cerveja e ela um copo de vinho branco alentejano… no almoço a conversa girou em torno de uma assunto recorrente: as pessoas que gostam de acordar cedo nas férias para aproveitar melhor o dia, como se as horas de férias valessem uma boa quantia (tempo é dinheiro) e portanto devessem ser aproveitadas na maior parte do tempo possível…

Josias Germano expôs para Marília Olávia o raciocínio tôsco deste tipo de pessoas: “já que tiramos um mês de férias para cada onze meses de trabalho, cada hora das férias vale onze horas de trabalho, logo um cochilo após o almoço, nas férias, pode significar vinte e duas horas de trabalho, ou seja a metade das horas pagas em um trabalho semanal regular”.

Depois foram para o hotel cochilar, é claro…após acordar e constatar que o cochilo que tiraram valeu bem mais a pena do que meia semana de trabalho… foram caminhar… tomaram o rumo ao bairro do Rato, mais precisamente na praça das Amoreiras, para apreciar a luz ao final do dia… lá se depararam com uma placa azul cobalto com a seguinte mensagem: UM AZUL COBALTO PARA A FELICIDADE… depois com uma placa amarelo limão escrito: UMA AMARELO LIMÃO PARA A GRAÇA… outra placa: UM LARANJA PARA EXERCER A VISÃO DE UM LIMOEIRO AO LONGE…

Eram frases de um poema chamado “Testamento” de Vieira da Silva, a ilustre pintora portuguesa, cujo museu (Fundação Arpad Szenes/Vieira da Silva) situa-se defronte a praça em questão…

Visitaram o museu, afinal Josias Germano afirmara com veemência que Portugal tem dois pintores geniais: Vieira da Silva e Almada Negreiros.. o segundo além de pintor genial também é um escritor genial, uma vez que seu conto “Saltimbancos” antecipa em cinco anos o famoso estilo de escrita que descreve o fluxo de consciência presente no final de “Ulisses” de James Joyce…

Voltaram pois precisavam jantar, porém ao chegar no Largo do Rato foram abordados por um senhor idoso embora ainda forte (lembrava um velho boxer), que trajava terno e gravata azul marinhos, camisa azul-clara. O senhor pediu pára que ambos apreciassem por instantes a Capela do Rato e então disse:

– “Para que serve a religião? Para as pessoas viverem em sociedade… porém existem outros seres, seres fantásticos… que vivem em sociedade em não possuem religião: as abelhas, os cupins e as formigas….”

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