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REI LEAR – William Shakespeare – Editora 34 – Tradução: Rodrigo Lacerda

Glauber Rocha dizia que o teatro grego é a Memória da Grécia, o de Shakespeare a Memória do Mundo… Harold Bloom afirma que uma boa parte do que vemos hoje como a personalidade humana é uma invenção ou reinvenção shakespeariana (*)… embora já tendo lido alguns clássicos, li somente umas cinco peças de Shakespeare, e uma das minhas metas como leitor é ler aos poucos grande parte da obra do bardo inglês… para tal, resolvi agora ler Rei Lear.

Nesta tragédia, um velho rei decide repartir seu reino pelas três filhas e prepara uma cerimônia para que as três filhas o elogiassem na frente de toda a corte. A filha maior velha e a do meio fazem o discurso tradicional enaltecendo o pai, porém a caçula e preferida do rei, diz que nada tem a declarar pois o amor que ela tem ao pai já basta… O rei Lear fica furioso, a deserda e expulsa-a da Inglaterra… Decide repartir o reino entre as duas filhas e morar parte do tempo com uma, parte do tempo com outra, com sua pequena corte de cem pessoas…

Após uma série de desavenças, ele perde sua corte e é expulso pelas filhas em meio a uma tempestade, tendo só por compania o bobo da corte… Então se dá, uma das cenas mais contundentes da literatura (Cena 2 do Ato III) quando Lear ensandecido em meio a tempestade clama para que os ventos, raios, cataratas, furacões  e labaredas, destruam, inundem e queimem toda a humanidade…

Observando estas tempestades que estão a assolar nestes dias o litoral norte de São Paulo, a própia capital, bem como os desatres naturais que assolam nestes últimos tempos a maior parte do planeta, eu me pergunto:

Será que como o Rei Lear, o ser humano não largou o governo de si mesmo, deixando-o para as suas criações? Será que não estamos trabalhando mais e mais para produzir mais e mais objetos? Será que quando alguém se sacrifica muito para obter algum bem, ele fica dono deste bem? Ou o bem fica dono dele? Será que com a escrita artificial não estaremos abrindo mão de nossa capacidade cognitiva, uma vez que o pensamento é (ou deveria ser) estruturado pela escrita?

Será que o ser humano percebeu que abriu mão de sua capacidade de governar o mundo, transferindo-o aos objetos, e arrependido, inconscientemente clama para que a natureza destrua tudo?

Talvez esta interpretação seja um tanto quanto rasa.. Talvez o Chatgpt produza algo muito melhor… mas o importante não é isso… 

O importante é ler mais Shakespeare… pelo menos nosso raciocínio melhora e na hora da hetacombe estaremos lendo algo decente…

Ops! Já ia esquecendo… tenho também que elogiar esta edição bilígue muito bem traduzida e com um excelente posfácio do próprio Rodrigo Lacerda.

(*) Shakespeare: A Invenção do Humano – Harold Bloom – Tradução: José Roberto O´

Shea – Ainda não li este livro, confesso que ainda me falta bagagem, preciso ler mais peças do Shakespeare, preciso ler Geoffrey Chaucer também, para ver se Erza Pound tinha razão ao dizer que a obra deste era mais universal do que daquele, mas cada coisa no seu tempo…

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